T E M P O S &
CONTRATEMPOS
Bem-vindo.
Aqui você vai encontrar as melhores histórias de minhas vivências
profissionais.
As situações limite. Aquelas que nos permitem aprender muito. Tudo verdade.
Perceba que, em alguns momentos,
a coisa ficou quase que crítica,
mas as saídas encontradas, fizeram com que alcançássemos os objetivos.
E principalmente, hoje conseguimos dar muitas risadas.
Divirta-se.
Os textos abaixo, fazem parte de um livro, a ser publicado, contando minhas aventuras na área live marketing.
Paulinho vem ao Rio
Abril 1990
Era o início de uma nova década.
Pela primeira vez na história um Beatle no Brasil para tocar
no Maracanã.
19 e 21 de abril de 1990 entrariam para a história do maior
estádio do mundo.
Um público recorde para assistir ao show de
PAUL McARTNEY.
Quando a notícia se espalhou, o mercado ficou agitado.
Quem seriam os patrocinadores de um evento daquele
tamanho.
Nesta época, eu era o cara de propaganda e promoções
de uma grande distribuidora de petróleo.
Logo me aventurei a entender a proposta de patrocínio,
direitos etc.
Era o final de 1989. O Brasil estava naquela gangorra da inflação. E as empresas estavam, mais uma vez, tentando se planejar. Chamei um encontro para negociar a reunião com a agência organizadora do projeto PAUL IN RIO.
Foi um desastre. A grana envolvida era enorme. Havia um interesse do mercado muito grande. Meus argumentos foram inúteis. E mesmo a experiência de venda de ingressos em postos de gasolina, uma inovação
nossa, não conseguiu seduzir nossos interlocutores. E assim foi. Não dava pra nós.
Mas o que ninguém esperava é que logo no início do ano um novo plano econômico fosse lançado.
Os organizadores estavam otimistas até então.
Em 15 de março de 1990, toma posse o Presidente Collor.
E no dia 16, o dinheiro sumiu.
Sumiu do bolso de quem poderia comprar o ingresso, arquibancada a NCz$500,00 (US$40,00) ou NCz$700,00
(US$60,00) para a pista, e também dos possíveis patrocinadores.
O maior confisco da história econômica da República estava em curso.
Dez dias depois do lançamento do Plano Collor, fui convidado para um happy hour. Assunto: PAUL IN RIO.
Não tinham conseguido vender o show como imaginaram. E o pior, os ingressos estavam micados.
Só havia um ponto de venda.
Lembrando aos apressadinhos que em 1990, não existia a internet.
Nos encontramos no escritório dos promotores do show.
Final da conversa; venderíamos ingressos em nossa rede de postos, mas teríamos também que vender nos postos de São Paulo. Eles distribuiriam os ingressos nos postos do Rio de Janeiro e nós nos postos de SP. Era uma promoção de venda antecipada, com desconto: 60.000 ingressos no Rio e 20.000 em São Paulo.
Em 15 de abril prestaríamos contas e devolveríamos todos os ingressos restantes.
Além do custo da operação promocional, nós pagaríamos também o rabicho do filme de tv, isto é, os endereços de onde os ingressos estavam sendo vendidos.
Feito!!!
Consegui estar no evento do meu maior ídolo.
Ainda hoje tenho na garagem de minha casa um painel de oito metros de comprimento por três de altura anunciando uma temporada no Brasil.
Tudo certo. Consegui. E a um custo baixíssimo para a empresa.
No dia 28 de março convidamos os revendedores de São Paulo para apresentar a promoção, mas havia um pequeno problema: Como enviar os ingressos para São Paulo de modo que chegassem a tempo da reunião para serem repassados aos revendedores e de maneira segura?
Afinal estávamos falando de cerca de NCz$ 10.000.000,00 isto é cerca de US$ 830,000,00 da época.
Mas naquela altura já havíamos embarcado no trem fantasma, a ação estava na rua.
Material promocional impresso; ingressos distribuídos nos postos do Rio. Filme refeito e no ar. Contrato assinado. E transportar os ingressos para São Paulo não poderia ser a pedra no caminho.
Tomei a frente e disse: não há problema. Eu levo amanhã na primeira ponte aérea os ingressos para São Paulo.
Ótimo. Tudo certo.
Morava naquela época na Barão de Itapagipe, zona norte do Rio.
Em um daqueles prédios que tem dez apartamentos por andar. Começo de vida. Apertadinho, mas bem aconchegante.
Pelas 9 da noite toca o interfone;
-Seu Luiz tem um carro desses de entrega de dinheiro aqui querendo entrar no condomínio. Dizem que tem uma entrega para fazer. E precisa ser só pro Senhor mesmo.
Imaginem um carro forte procurando por um morador para fazer uma entrega, que certamente não era de pão fresco.
Pensei. Pensei. O que seria?
-Ok manda subir.
Em poucos minutos apareceram em minha porta, cinco seguranças enormes.
Armados até os dentes.
Quatro com pistolas e uma caixa tipo de arquivo em mãos e o quinto com uma metralhadora em punho.
Quando olhei pelo olho mágico, pensei: Danou-se!!!
Sem falar nada, abri a porta.
Todos entraram e um deles perguntou: -Onde põe doutor? `
Engoli seco. E pensei: tomara que eles estejam se referindo as caixas.
E respondi com firmeza: pode deixar aí.
Largaram as quatro caixas e foram embora. Amém.
Depois do choque comecei a raciocinar; olhei o tamanho das caixas. Eram do tamanho destas que usamos em arquivo de papeis.
Depois fui checar o peso. Só dava pra levantar uma de cada vez, afinal cada uma delas tinha
5.000 mil ingressos dentro.
5.000 MIL!!!!!
5.000 X NCz$500,00=NCz$2.500.000,00!!!X4!!!!!
Simplesmente NC$10.000.000,00!!!!!! Quase 1 milhão de dólares. Simples assim.
Não só a ficha caiu, mas todo o resto em volta também.
Eu comecei a entender, o espanto do porteiro no interfone, os seguranças armados.
Não conseguia imaginar uma forma segura de estar de olho naquelas caixas o tempo todo.
Lógico que não pensei nisso quando me ofereci.
Afinal os ingressos eram pequenos. Como um cartão de crédito.
Mas eram 20.000!!!
Praticamente não dormi à noite. Acordei às 5 da manhã e às 6h30 estava no balcão da ponte aérea no Santos Dumont.
Até ali tudo certo. Carreguei os ingressos de casa até o taxi no carrinho de supermercado do condomínio.
No táxi, ok. Tudo no porta-malas.
No aeroporto, mais tranquilo, peguei um carregador e pronto.
Quase metade da epopeia terminada.
Fiz o meu check-in e fui despachar as caixas com um monte de adesivos de frágil. Rezava para que, mesmo reforçadas elas não se despedaçassem no compartimento de cargas do Electra II da VARIG.
No despacho, a coisa encrencou.
-O Senhor vai ter que pagar excesso de bagagem.
Respondi: Ok, ok. Veja quanto é.
-Que é que tem aqui? É de quebrar?
Gelei!!! Não se pode transportar mercadoria sem nota fiscal. E principalmente ingressos para qualquer espetáculo...
eram 20.000!!!
-Ah meu amigo, estou com um pouco de pressa... São arquivos pessoais que estou levando para a família. Nada de muito importante, disse ao despachante.
-Tá aqui o papel. Vai ali naquele balcão e volta aqui pra eu te dar os comprovantes.
Fui até o tal balcão pagar.
Só que quando vi o valor e comparei com o que tinha na carteira, só daria pra pagar com cheque ou cartão.
Entrei na fila.
Preocupado.
O tempo estava passando e nada.
Tentei me acalmar, se não der pra ir nesse voo vou no próximo.
Ok, ok. Pensei tentando baixar a adrenalina.
Minha vez.
-Bom dia. Posso pagar com cheque? Perguntei.
-Não, Senhor só aceitamos dinheiro ou cartão.
-Tá bom. Vamos lá então...
Primeira tentativa – nada.
Segunda tentativa – sistema fora do ar.
Ouço então o barulho das hélices do Electra II levantando voo. Pronto já perdi um, pensei comigo.
Terceira tentativa -Senhor, o Senhor pode chegar aqui pro lado para eu atender os outros. Seu cartão não está passando.
A essa altura já estava suando de nervoso. A qualquer momento descobririam o que havia nas caixas e eu estaria preso.
Cambista de ingressos!!!
Passados os dois caras que estavam atrás de mim, ela voltou a me atender.
Foram mais três ou quatro tentativas até que finalmente a transação foi aceita.
Voltei correndo ao balcão de check-in.
Cadê o cara que me atendeu?
Procurei. Procurei. Sumiu o desgraçado.
Não sabia o nome.
Me dirigi então ao que estava disponível.
Apresentei o comprovante de pagamento e troquei o horário de meu bilhete.
E aí fiz a pergunta errada: -Por favor, poderia checar se a bagagem referente a esse pagamento de excesso de peso está ok?
-Ah. Claro Senhor. Só um momentinho que a sua bagagem deve estar ali na sala aguardando embarque.
Mais espera.
Mais aflição.
Que maldita ideia a minha.
Após alguns minutos vem o atendente com cara de ué!
E meio que balbuciando me diz:
-Senhor. Aaachhooo queee sua baaaagageem foi no voo anterior. Por que o Senhor não embarcou?
Não acreditei no que estava ouvindo.
Tive vontade de gritar, esbravejar e colocá-lo como sócio no pagamento dos dez milhões de cruzados novos, aos organizadores do show.
-Mas fique tranquilo que se não foi no outro vai nesse.
Nesse momento o sistema de som chama a ponte aérea para embarque.
Nem tempo de argumentar teria.
Virei as costas e fui embora.
Seria uma das horas mais longas de minha vida.
Fiquei imaginando o que dizer se as caixas sumissem. Qual a explicação? A companhia aérea?
E depois como eu iria conseguir pagar aquela grana.
Entrei no avião e sentei no corredor logo na última fileira da parte dianteira, do Electra 2. O mais perto da porta possível.
Estava agitado.
Não conseguia ficar parado.
Mal o avião pousou eu já estava à frente da porta esperando para sair.
Quando desci, fomos indicados a pegar um ônibus.
Mas eu não conseguia esperar mais nada.
Saí correndo pela pista que dava acesso ao terminal de chegada do aeroporto
de Congonhas.
Queria os meus dez milhões de cruzados em minha mão novamente.
Muita gente me olhou.
Quando cheguei às esteiras de bagagem, vi aliviado, finalmente, as quatro caixas rodando sem que ninguém houvesse tocado nelas.
Abracei as caixas, e beijei.